A queda de Jair e o culto à juventude

Foto: Ivan Storti/SFC

Sempre que surge um novo treinador, desses promovidos da base ao time titular, a mídia repete o mesmo chavão: é jovem, estudioso… e vai em frente acendendo as esperanças do torcedor.

Estudioso? Estuda o quê? Na sua área de atividade, tão carente de informações básicas, passa a ser chamado de professor. Professor de futebol, claro.

Essa pequena diferença semântica – de técnico a professor – já faz a grande diferença. O técnico é, antes de tudo um técnico, um pragmático, alguém que desenvolveu seus conhecimentos empiricamente, na prática. Um professor é alguém que se debruçou nos livros do conhecimento de sua matéria, cumpriu um estágio escolar de alto nível e passou a professar sobre aquele determinado assunto.

Um professor de português, pra merecer seu diploma, precisa conhecer latim, a matriz de nossa língua, um pouco de grego, pelo menos, conhecer os clássicos e seus descendentes na literatura, a origem das palavras e o processo de transformação vivida por esse idioma ao longo da história.

Um professor de química tem de conhecer as origens das misturas desde os remédios dos xamãs de um passado remoto até às últimas conquistas dos laboratórios internacionais, passando pelos alquimistas medievais.

E assim vale para todas as cátedras.

Contudo, o que estudam nossos jovens professores? Debruçam-se sobre a história do futebol, desde seu nascimento, ou sobre o processo de evolução dos sistemas táticos, que, no fim das contas, é seu principla desígnio?

Pelo tanto de conversas que tive com alguns deles, ou simplesmente pelo processo de observação de seus trabalhos, permita-me o amigo reservar um monte de dúvidas a respeito.

Mas, no futebol, como na vida, o que se fixa é o clichê da primeira impressão: se for jovem e ainda por cima usar óculos e falar articuladamente, é estudioso, ponto final.

É o culto à juventude que há muitas décadas se transformou no altar das sociedades ocidentais: adultos esticando a adolescência e velhos correndo pelas alamedas, com fones nos ouvidos, em busca a juventude irrecuperável.

Tô me derretendo nessas filosofices, como diria Seu Barbosa, inspirado na demissão precoce de Jair Ventura. Precoce pelo tempo transcorrido desde sua contratação, mas já madura há muitas rodadas.

Jair, ao assumir o Botafogo, mergulhado numa crise incontornável, conseguiu manter o time numa situação digna. Seu time jamais empolgou por um pretenso alto nível técnico, tampouco marcou época com conquistas memoráveis. longe disso. Apenas apelou para o velho esquema de fechar a casinha e ir aqui e ali surpreendendo os  adversários neste ou naquele contragolpe. Nada fora da caixa armada por seus antecessores das últimas duas décadas no futebol brasileiro. Receita aviada em série por todos os nossos treinadores, jovens ou veteranos.

Assumiu o Santos, vice-campeão brasileiro, um dos raros times brasileiros que carregam em seu DNA o gosto pelo jogo ofensivo e leve, desde os tempos de Arakén Patusca até Neymar, passando por Pelé, Robinho etc.

Trata-se de uma história impossível de não constar no chip de qualquer técnico brasileiro.

Jair desembarcou na Vila, e logo foi afastando do time titular dois esteios da conquistas do vice: o veterano Renato e o jovem Vítor Bueno, que poderia perfeitamente quebrar o melhor galho no lugar de Lucas Lima, transferido para o Verdão.

Como o Peixe já havia perdido antes Tiago Maia, o cerne da equipe não conseguiu ser remodelado a contento. Sem meio campo, não há ataque. E sem ataque, não há Santos.

Cabe, agora, ao Santos buscar um treinador cujos conceitos sejam adequados à história visceral do clube.

Fazendo uma varredura por aí, tá duro de achar. O único que escapa ao lugar-comum é Fernando Diniz, que, depois do Audax, não conseguiu ainda emplacar seu estilo com êxito em nenhum outro clube, o que é sempre uma barreira para um Peixe que está em situação crítica na tabela.

É esperar pra ver.

 

 

3 comentários

  1. Antes de tudo, parabéns pelo texto! Uma perfeita explicação sobre os falsos professores de futebol que temos e que surgem a todo instante aqui no Brasil, e provavelmente em vários outros lugares do mundo.
    Sou professor universitário e coordenador do curso de educação física de uma universidade, sendo considerado jovem para o cargo que ocupo; sendo que muitas vezes existem elogios exagerados em algumas ações, que sempre são acompanhados do comentário: “Se fosse aquele velho do X que estava aqui antes, ele nunca teria feito isso” ou “Não tem nada melhor do que sangue novo, gente que quer crescer” e por ai vai. Mas felizmente, ao contrario de muitos jovens treinadores e principalmente cartolas de clubes, eu sei que não é a idade que lhe impede de se atualizar ou então perder a gana. Apesar de minha pouca experiência, já tive a oportunidade de ver senhores com mais de 80 anos esbanjarem categoria com a tecnologia, com fome de novas conquistas e principalmente, com a humildade de reconhecerem que não são os donos da verdade; enquanto alguns jovens que por saberem um pouco mais do que a média já se intitulam o rei da sabedoria.
    Quando comecei a acompanhar futebol, na década de 90, ao surgir novos treinadores, que começaram a desbancar alguns experientes carregados de soberba; eu ia ao delírio, entretanto boa parte destes jovens se tornaram soberbos e o pior, os jovens treinadores de hoje apesar de um conhecimento raso acerca do futebol brasileiro, ao conquistarem meia dúzia de vitorias já pensam ser um gênio do futebol.

    Mais uma vez, parabéns PROFESSOR ALBERTO HELENA JR.

  2. Alberto Helena Jr.

    Excelente análise colocado num texto que deveria servir de cartilha para essa molecada que sai aos montes das “faculdades de jornalismo” e que acham que um canudo na mão vão lhe dar a vivência e experiência necessárias ao bom desempenho profissional como jornalista, não existem mais tantos jornalistas como você Alberto, imparcial, não clubista embora deva torcer por algum time é lógico mais que deixa a faceta de torcedor para a arquibancada e não para a redação, como você disse em outro comentário se tiver que levar elogio leva e se tiver que levar pau também leva não importando a cor da camisa, você Alberto, Mauro Betting, e mais alguns não muitos devem servir de exmplo para essa garotada “jornalista” a maioria criada no colinho da vovó, em apartamento e que no máximo que se aproximou de uma bola foi de sapato brincando no play do condomínio, não sabem nem o “be a ba” do futebol e querem ditar regras, então precisamos de profissionais como você para colocá-los nos trilhos da seriedade para encarar a profisssã0. Saudações palmeirenses.

  3. Acredito que professor ou mestre possuam como ponto de partida a cultura popular, onde aqueles que denominam de maneira peculiar um conhecimento formal ou mesmo informal, `e chamado de mestre, de professor, quem comanda um processo de ensino-aprendizagem, inclusive existe uma maxima ( nao conheco o autor) que dita que: ” Todo processo de ensino-aprendizagem” depende de duas linhas distintas, A CAPACIDADE DE QUEM ENSINA, e a VONTADE DE QUEM QUER APRENDER”, ou seja, conhecimentos hoje aceitos e considerados como empiricos foram em epocas bem recuadas, questionados, desacreditados, desvalorizados, enfim, precisaram do crivo do tempo, e da “resistencia” ferrenha daqueles que os representavam para consolidar-se como tais e quais. Sim, quem ensina, quem comanda um processo por ter mais experiencia/ e ou capacidade, `e sim chamado de professor, em alguns casos mestres, e sabemos que existem escalas de valores para o professorado e o mestrando que variam em grau numero e genero, mas tudo isso sem desmerecer o que foi aprendido e `e expandido longe dos campos academicos. Ja com relacao ao Jair Ventura, a grande verdade `e que comissao tecnica e jogadores vivem e “sobrevivem” sobre o imperio de resultados, isso `e INQUESTIONAVEL., como os resultados nao estavam vindo, entao torno-se necessario trocar o treinador, assim como um profissional da area de saude troca o medicamento do paciente quando esse medicamento nao esta surtindo o efeito desejado no organismo, e ninguem em sa consciencia prega que a medicacao ” nao teve tempo” para ajudar na melhora do enfermo. O que questiono `e que o Jair deveria ter sido dispensado NA PARADA PARA A COPA DO MUNDO, pois assim o novo treinador teria tempo de conhecer o elenco, assim como o de ser conhecido pelo mesmo, porque vai assumir agora, no meio de duas competicoes importantes e dificeis, sobre pressao, com um elenco que provavelmente precisara de tempo para engrenar, mas mesmo assim acredito que meu peixao seguira vivo.

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