Lances polêmicos da 22ª rodada do Brasileirão

Foto: Divulgação/Palmeiras

Róger Guedes, no jogo Corinthians x Palmeiras, deveria ser expulso por jogo brusco praticado contra Gustavo Gómez

Série-A – Lances mais polêmicos – 22ª rodada – 13 e 14/08/22

As regras são tão mais justas quanto mais definem com precisão as matérias que disciplinam.

Jogo 1 – Palmeiras x Corinthians – Róger Guedes deveria ser expulso

Assim como Danilo e Scarpa foram expulsos corretamente no jogo do Palmeiras contra o Atlético Mineiro, pela Copa Libertadores – dia 10-08-2022 –, como dissemos na correspondente coluna, Róger Guedes deveria ter sido expulso na partida sob análise.

Antes de tudo deve ser informado que para haver jogo brusco não é necessário que o jogador que sofra a ação seja atingido, muito menos que seja lesionado, até porque as tentativas são igualmente punidas.  Basta, portanto, que a integridade física de um jogador seja posta em risco, por meio de uma entrada, de uma disputa ou, ainda, de um ato de brutalidade.

Ora, se a ação de Róger Guedes foi em direção bem distinta da bola e claramente contra as pernas de Gustavo Gómez, com a sola da chuteira e bem acima do tornozelo, não é possível conceber-se que o lance foi apenas para cartão amarelo, pois sequer houve tentativa de disputar a bola. Não se tratou do só colocar o pé, mas de impulsioná-lo contra o adversário, com claro risco de lesão.

Pontue-se que o fato de a regra não exigir que haja contato físico aponta para seu principal objetivo, que é preservar a integridade física dos jogadores. Aliás, se a regra exigisse contato e lesão perderia sua força e natureza preventivas.

Trabalhar com o resultado da ação, ou seja, se houve contato e/ou até se houve lesão são circunstâncias que podem fazer parte da arbitragem, mas apenas quando o árbitro não percebe o lance com nitidez. Havendo VAR, todavia, as imagens devem ser a base de tudo.

No caso, já que as imagens são claras e provam que Róger Guedes foi além do assumir o risco de lesão, pois praticou ação deliberada para tanto, o competente Raphael Claus deveria rever sua decisão e expulsar o jogador do Corinthians, acolhendo a revisão recomendada por Rodrigo Guarizo, porque houve um erro claro, óbvio.

As ações da espécie não podem ser julgadas com base em elementos subjetivos: a força não foi tanta; o adversário valorizou o contato; o contato não foi para tanto etc. etc. Logo, se não houver uma evidência indiscutível da leveza da ação, o cartão vermelho é a única decisão correta.

Com efeito, tais análises ou justificativas só provocam violência no futebol; criam instabilidade para as arbitragens; e, principalmente, se afastam da natureza preventiva das regras.

É também importante dizer que o fato de o pé de Róger Guedes ter passado entre as pernas de Gustavo Gómez, ao invés de abrandar a ação, revela que houve intenção de lesionar, pois, do contrário, Róger teria recolhido seu pé bem antes de ultrapassar o espaço ocupado pelas pernas de Gustavo. Aliás, Róger sequer teria praticado a ação, pois seu movimento foi claramente em direção oposta à da bola.

Por fim e para evitar mais confusão sobre os limites de atuação do VAR, deve ser afastada a pobre teoria de quem entendeu que o lance seria para cartão amarelo, mas, contraditoriamente, julgou como correta a atuação do VAR, sob a suposição de que a narrativa do árbitro teria sido distinta do desenho da jogada e que, por isto, o VAR teria recomendado a revisão acertadamente.

Essa concepção é completamente contrária à filosofia do VAR, que limita sua atuação para corrigir erro claro, óbvio, pouco importando se o árbitro estava próximo ou longe do lance; se viu ou não viu a jogada; se narrou ou não o fato como ele ocorreu.

Admitir tal ideia é dizer que o VAR existe para dar uma segunda oportunidade para o árbitro rever a jogada, como, aliás, foi dito pelo autor de tal “obra prima”.

Resumida e claramente: o que importa e o que somente autoriza a intervenção do VAR, independentemente de qualquer circunstância, é que, a seu juízo e com base na regra, um erro claro, óbvio haja sido cometido. Fora daí é invencionice de quem se irroga especial, senão deus – de barro, embora –, e deseja fazer regra particular.

O bom-senso recomendado para a arbitragem é para se respeitar a essência do jogo, não para desconsiderar os textos das regras.

Jogo 2 – Internacional x Fluminense – Gol anulado do Internacional

A decisão de anular o gol do Internacional porque havia parte do corpo do atacante que fez o passe avançada, já que o VAR usou a tecnologia de modo correto, foi legal e, portanto, justa.

A inclusão de tal lance em nossa coluna, desse modo, só se justifica para combater a ideia de que a regra não estaria respeitando a essência do futebol, tendo em conta a parte do corpo do atacante adiantada: a região glútea.

Em primeiro lugar, deve ser dito, porque o lance foi de fato, não de interpretação, que não há base técnica para controvérsia.

Depois, porque indagar se a regra estaria ou não respeitando a essência do futebol é raciocinar na contramão do que é justo e analisar a regra somente por uma nuance, em lugar de se considerar todas as possibilidades, até por ser da essência de toda norma prever o todo, o geral, não apenas o particular.

Sendo assim, não importa nem deve importar a região do campo, nem a parte do corpo de um atacante que esteja adiantada.

Do contrário, teríamos a instabilidade de analisar a região do campo; a parte do corpo adiantada; e, até, se o gol foi marcado com a parte adiantada ou com outra. Seria, por consequência, dizer: se um jogador tiver a cabeça adiantada, mas se fizer o gol com o pé, o gol será válido. Ou, de outra, se os pés estiverem adiantados, mas se o gol for feito com a cabeça, por igual o gol será válido. Ou, ainda, se um jogador estiver com parte de seu corpo adiantado na zona intermediária, não deve ser punido por impedimento; se isto, porém, ocorrer na área penal, haverá impedimento; e por aí vai…

Tal ideia, no caso específico, corresponderia a dizer que se o passe tivesse sido feito com a região glútea do atacante, que o gol deveria ser anulado, mas porque o lançamento foi feito com o pé que o gol deveria ser confirmado. A inconsistência seria total. A regra está certa, pois.

O princípio da generalidade e da abstração de toda norma, ou seja, o disciplinamento de todas as situações iguais de modo igual – no caso, independente da região do campo e da parte do corpo que esteja adiantada –, é que dá força e natureza de justiça à regra.

De toda sorte, o que deve prevalecer é a regra.

Repita-se, pois: As regras são tão mais justas quanto mais definem com precisão as matérias que disciplinam.

Ao leitor, a palavra final.

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