Diretrizes de arbitragem para 2023

Foto: Divulgação/Palmeiras

A aplicação de diretriz pré-existente e que não vinha sendo cumprida não constitui inovação, mas simples afastamento de omissão que não deveria ter ocorrido.

Com ares de novidade, mas apenas para incautos, o Sr. Wilson Seneme, Presidente da Comissão de Arbitragem da CBF, anunciou algumas medidas que serão adotadas nas competições de 2023, conquanto em sua maioria sejam velhas, pré-existentes e até façam parte das regras do jogo.

O que Seneme talvez tenha pretendido dizer, para não incorrer em prática de engodo, é que algumas regras e/ou diretrizes esquecidas voltarão a ser aplicadas nas competições do ano em curso, inclusive na Copa do Brasil, que já foi iniciada.

Espera-se que as promessas sejam cumpridas, conquanto sejam pouco, muito pouco em relação às necessidades de nossa arbitragem e do nosso futebol, este que, não raro, apesar da magnitude, tem feição de várzea.

Algumas das diretrizes anunciadas merecem análise:

a) Impedimento – sobreposição de linhas

Como se se tratasse de novidade, Seneme afirmou que, doravante, não haverá impedimento quando as linhas virtuais traçadas em relação aos atacantes e defensores se sobrepuserem.

Tal assertiva causa espanto, pois nunca foi diferente. Afinal, a regra “11 – Impedimento” estabelece que quando atacante e defensor estiverem em linha que não haverá impedimento.

Desse modo, além de não ser novidade, a afirmativa de Seneme beira a “inocência”, por não ser crível que ele desconheça a regra.

De não se tratar de “inocência”, tratar-se-ia de vender como potável a água do mar.

b) VAR – Imagens e diálogos

Segundo Seneme, as imagens e áudios dos lances que estiverem sendo checados serão disponibilizados, em tempo real, para o público, logicamente quando o jogo estiver paralisado e nos estádios em que seja possível.

Neste ponto, a Comissão de Arbitragem merece aplauso, efusivo aplauso, sobretudo porque a IFAB – International Association Board, entidade que cuida das regras do jogo, por meio da circular 27 de 23/03/2023, afirmou que o assunto continuará em estudos, significando dizer que tais divulgações ainda não estariam autorizadas, o que denominamos de “Segredos da arbitragem”.

De outro lado, este aspecto merece duas observações: a primeira é que a FIFA, retirando da IFAB, avocou para si as regras sobre o VAR, significando dizer que a IFAB, ao estabelecer a proibição estaria legislando sem competência; a segunda observação é sobre se a CBF não retroagirá em sua postura, caso haja censura da entidade maior, o que seria lamentável, principalmente pelo retrocesso, bem como pelo desgaste institucional da CBF em tomar decisão que contraria uma norma expressa.

Não é demasiado repetir, para justificar o aplauso à postura da CBF, que, como temos dito reiteradamente, “a transparência é o maior escudo para quem age com ética”.

Para encerrar este assunto, cumpre dizer que os pensamentos contrários à divulgação dos vídeos e áudios do VAR, ao lado de colidirem com o referido princípio da transparência, desconsideram que o aspecto mais importante é a correção da decisão, de modo que os possíveis erros ou imprecisão técnica nos diálogos serão essencialmente irrelevantes.

c) VAR – Pressão sobre os árbitros

Seneme também se referiu às medidas disciplinares que devem ser adotadas contra jogadores e oficiais de equipe que pretenderem pressionar os árbitros nos momentos das revisões.

Uma vez mais, não se trata de diretriz inovadora. Com efeito, ao lado de ações disciplinares contra os protestos já estarem previstas textualmente no Protocolo do VAR, a própria regra 12 e sua essência autorizam tais medidas, uma vez que os atos de pressionar os árbitros caracterizam atitude antidesportiva.

Não obstante, apesar de não se tratar de novidade, de não ser diretriz com origem na atual Comissão de Arbitragem da CBF, mas de simples dever de cumprir as regras do jogo, tanto a geral como a específica do VAR, o afastamento da elevada parcimônia de nossa arbitragem ocorrida no ano passado, já será um grande passo em benefício de nossas competições.

Por último, conquanto compreendamos o aspecto emocional dos jogadores e dirigentes, não podemos deixar sem registro nossa visão, no sentido de que tais protestos são fruto de puro amadorismo, porquanto as decisões da arbitragem, no particular, só ocorrem com base nas imagens que o árbitro, queiram ou não os jogadores e oficiais de equipe, analisará. Os protestos, pois, são sem qualquer sentido. Repita-se: fruto de puro amadorismo e que somente prejudicam as equipes quando aplicados os devidos Cartões Amarelos e, até, Vermelhos.

d) Aquecimento de jogadores

Uma vez mais, Seneme anuncia como novidade a limitação de no máximo 06 jogadores aquecerem simultaneamente na borda do campo.

Tal medida, além de não ser nova, porquanto já foi praticada anteriormente, não produz o efeito desejado.

Primeiramente, porque 06 jogadores, apesar de causarem menos impacto visual de “várzea” do que 12, causam as mesmas consequências negativas, como a proximidade do campo; ações de protestos contra a arbitragem; invasão de campo (inclusive para comemoração de gols) etc. etc.

Desse modo, como, aliás, sugerimos ao Sr. Ednaldo Rodrigues, em relatório que lhe encaminhamos após a denominada “Concentração da Arbitragem na Granja Comary”, no final de 2021, a solução deste problema só ocorrerá com limitação geográfica e específica nos estádios para aquecimento dos jogadores; sem proximidade do campo; com coletes em cores vivas e bem distintas das dos jogadores de ambas as equipes e com numeração igual à das camisas; e com adoção de medidas disciplinares para as transgressões.

Prova, aliás, o que, inclusive, já enfraquece esta “nova” diretriz da Comissão de Arbitragem da CBF, foi a invasão de campo de todos os jogadores do Maringá no jogo da Copa do Brasil contra o Flamengo, para comemorarem um gol e sem que tenham sido adotadas as medidas disciplinares proporcionais às transgressões, dando o vivo e lamentável sinal de que “tudo continuará como dantes no quartel de Abrantes”. Espera-se que não.

e) Acréscimos – Comemoração de gols e pênaltis

Sobre estas facetas, vale transcrever inteiramente o conteúdo de nossa coluna aqui na Gazeta Esportiva, de 30/03/2023, na qual pontuamos as incongruências e possíveis problemas que surgirão com uma postura rígida no particular, pois, se mal aplicada, a diretriz trará mais prejuízo do que benefícios para o jogo, especialmente em competições de longa duração como são os campeonatos brasileiros. Eis, na íntegra, nossa coluna, no particular:

“REGRA 7 – DURAÇÃO DA PARTIDA – comemoração de gols

Em que pese as normas deverem ser o mais claro possível, neste ponto a IFAB “choveu no molhado” e, talvez, provoque uma interpretação distorcida. De fato, pois, pela essência da regra, toda paralisação significativa do jogo deve ser acrescida ao final de cada tempo. Ora, sendo assim, ao destacar as comemorações de gols, a IFAB está assumindo o risco de os árbitros desconsiderarem as comemorações normais e acrescentarem todos os períodos correspondentes, gerando fuga da essência do jogo, pois as comemorações normais, como, aliás, a regra deixa entendido, não devem gerar acréscimos.

Nesse passo, recorda-se que os pênaltis marcados, sobretudo em jogos com VAR, que exigem confirmação, normalmente geram perda de tempo superior às comemorações dos gols, mas que não mereceram tratamento igual.

O certo, todavia, é que, no atual sistema de acréscimos, os árbitros estão negligenciando o aspecto preventivo, por meio do qual deveriam impedir paralisações indevidas, que têm tornado o futebol “chato”; quebram a autoridade dos apitadores; causam irritação no público; eleva a temperatura dos jogos; e provocam desânimo na equipe que está perdendo. Tudo, pois, milita contra o natural desenvolvimento das partidas.

Aguarda-se que uma boa instrução impeça que os árbitros sejam mais contabilistas do que aplicadores da essência da regra, de modo a evitar os inconcebíveis acréscimos de hoje, que beiram a 20%, em média, de cada período de uma partida.”

Deduz-se, pois, que, apesar de Seneme, adequadamente, também se referir ao aspecto da perda de tempo nos pênaltis, não tratou o assunto em harmonia com a essência da regra, ou seja, determinar acréscimos apenas quando as comemorações dos gols e as marcações dos pênaltis demandarem tempo anormal, ou seja, que fujam da naturalidade de tais ações, pois todas elas,

quando naturais, estão inseridas nos 90 minutos previstos para uma partida de futebol.

f) Conclusão

A conclusão de tudo é que Seneme, ao lado de anunciar normas e diretrizes velhas como “novas”, vendendo alguns peixes que não são seus, também não cuidou do aspecto mais importantes que é o resgate da autoridade dos árbitros para controlar todas as ações do jogo, de modo a lhe dar a dinâmica adequada e assim o tão esperado e indispensável cunho de normalidade.

Ao leitor, a palavra final.

Manoel Serapião filho

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *