Sangue nos olhos embaça a visão

Foto: Gazeta Press
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Agora pouco ouvi alguém defendendo Dunga na Seleção porque ele tem sangue nos olhos. Sangue nos olhos, pra mim, é conjuntivite, aquele inchaço que provoca coceira, deixa a pessoa irritada e atrapalha a visão.  Prefiro um técnico, isso sim, com visão clara de nossa realidade e que repouse um olhar inteligente sobre os campos da bola, capaz de montar um time cujo futebol seja colírio para os nossos olhos já semicerrados de tédio.

Sangue nos olhos, faca nos dentes, raça, garra, pega, mata e come, carcará! É esse canto de guerra  que mais se ouve por aí, como se o gramado verde fosse o campo da batalha final, o Apocalipse, agora e aqui. E o técnico da Seleção um Messias descendo das nuvens para comandar nosso exército de calções para a vitória decisiva, aquela que varrerá de nosso rincão sagrado todos os pecados, dores e aflições.

Foto: Djalma Vassão/Gazeta Press
Foto: Djalma Vassão/Gazeta Press
O carinha assume, junta a tropa, marcha unida e brada sua primeira ordem:

– Corta o cabelo dos recos!

Todo mundo na cama às dez horas, nada de entrevistas nem repórter enchendo o saco por aí, pois eles vão e contam pra todo mundo o que acontece por aqui. As pessoas ficam sabendo e isso não é nada bom. Aliás, nunca é bom que as pessoas saibam das coisas.

União, cada um de nós não é ninguém. Nós somos um. E aquele neguinho ali de cabelo enfeitado, se der dois dribles, quebre a espinha dele! E não quero chororô, que homem não chora. Porque eu sou é espada!, berra  grosso e alto que é para encobrir aquela vozinha doce que vem do fundo do armário da sua alma – “Nem tanto, nem tanto, bem”.

Todo mundo junto, fileiras cerradas na defesa da pátria, coração na ponta das chuteiras, ao embalo do hino que segue além do último acorde, que isto é guerra, meu! Guerra!

Peraí, pare o filme, o mundo, que quero fumar um cigarrinho lá fora.

Isso não é guerra. É uma imitação da guerra, uma sublimação das batalhas reais, esse horror inventado pelos homens, uma forma de transformar o pesadelo num sonho.

Isso, minha gente, é futebol, uma diversão para as tardes de domingo vadias e sonolentas. Isso é um brinquedo de criança revivido pelos marmanjos que sempre serão, no fundo, a mesma criança – o menino e a bola, como nas primeiras cartilhas de infância.

É Cândido espiando pela janela de sua casinha em Brodosqui o terreno baldio em frente onde meninos descalços chutam uma bola de borracha, de meia, de couro, de plástico Cena  que será retratada com os traços da modernidade, aclamada no mundo como  uma das tantas obras primas do gênio brasileiro.

É Friedenreich, El Tigre, dando seus botes felinos nas áreas inimigas. É o Homem de Borracha cortando o ar numa bicicleta fatal. É Zizinho desenhando impossibilidades no gramado, como um Da Vinci da Bola, assim chamado pelos jornalistas italianos que o viram em campo na Copa de 50. É Pelé, arrasando defesas com seu gênio incomparável. É Mané fazendo todo mundo de João Bobo.  É Romário, plantando na área toda a sua dissimulação e precisão. É Ronaldo rompendo defesas e Ronaldinho criando fantasias. E é Neymar, por fim, abrindo as portas da eternidade com seus dribles e invenções, em alta velocidade.

Isso é futebol. Isso é Brasil, pátria amada que dos filhos deste és mãe gentil. O resto é discurso vazio dos ressentidos e mal amados.

Pode dar certo, quem sabe?

Foto: Gazeta Press
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Não converso com Dunga desde pouco antes da Copa de 2010. Lembro que a última vez foi na Academia Brasileira de Letras, onde dei uma palestra sobre futebol e literatura.

Dunga estava lá à mesa de honra, ao lado de Ricardo Teixeira e João Havelange, além dos demais acadêmicos e o presidente da casa, ministro Villaça.

Antes, durante o ritualístico chá da Academia, ficou ali emburrado , respondendo monossilabicamente às minhas tentativas de aliviar o clima. E, depois da minha fala, fez um breve discurso exaltando as qualidades bélicas do futebol que poria em campo, tipo: isso aí é tudo poesia; na hora do vamovê a história é outra.

Bem, então vamos direto ao ponto, à prática. Na prática, quem resolve mesmo é o jogador em campo. Mas, quem escolhe o jogador é o técnico. E este o faz de acordo com o esquema de jogo que tenha em mente antes da convocação, certo?

Certo. Mas é aí que entra o erro inicial. Se o técnico é adepto de um futebol defensivo, desses que jogam por uma bola, em geral obtida pelo atacante talentoso e solitário lá na frente, então, vamos repetir os mesmos equívocos das duas últimas décadas.

Se, porém, o técnico resolve adotar um estilo mais compatível com nossas tradições, um futebol envolvente, feito de troca de passes e com espírito ofensivo, terá  de chamar jogadores com esse perfil.  Menos volantes, mais meias habilidosos, atacantes com mobilidade e capacidade para participar das tramas coletivas, não apenas o empurrador de bolas pras redes, beques que saibam sair jogando e que se atrevam a enfrentar o adversário no mano a mano, laterais que saibam marcar mas também atacar etc.

Em seguida, por meio de treinamentos adequados, formar o conjunto, um time compacto, que leve a marcação mais adiante, essas coisas todas que estamos cansados de ver nos campeonatos mais avançados do que o nosso e que aqui são tratadas como perdidas num passado remoto e romântico.

Aliás, essa é uma das nossas proezas: rotular o velho de novo e vice-versa.

Ah, mas não temos esses talentos todos, dirá o pragmático de plantão.

É verdade: não temos onze Pelés. Nunca tivemos. Nem mesmo onze Neymares. Mas, temos, sim, jogadores pra formarmos uma equipe competitiva dentro desse conceito de excelência. Basta ter olhos pra distinguir o talentoso do brucutu. E ter a coragem de colocar em campo os melhores, dentro desse molde. É o mínimo que se exige de um professor de futebol.

E, sobretudo, se livrar desse mal, amém, que é essa história de fechar o grupo. Quem ganhou Copa das Confederações ou Copa América passa a ter lugar cativo na Seleção, em nome da unidade do grupo.

Besteira . Futebol é momento, já dizia mestre Minelli no século passado. Na carreira de um craque, um ano pode ser uma eternidade.  Compare o Messi da Copa no Brasil com o Messi de um ano atrás no Barça e na Seleção Argentina. E olhe que estou falando do maior do mundo, assim eleito por quatro vezes seguidas, no auge dos seus 26 anos de idade. Nem sombra.

Aqui, tivemos os casos mais evidentes de Fred,  Jo, Paulinho e outros mais. E assim vai.

Portanto, na prática, o negócio é o seguinte: na hora do vamovê, às vésperas de uma competição importante, é dever do técnico escolher os que estejam em seu melhor momento. Ponto final.

Pois, voltando ao Dunga. Faz, portanto, quatro anos que não converso com ele. Logo, não sei o que pensa hoje. Talvez, não tenha mudado um milímetro de suas convicções. Mas, pode ser que não. Que o moço tenha visto o que acontece no  mundo moderno do futebol e mudado o prumo, nem que seja um pouquinho só.

Quem sabe, a partir daí não possa mudar os rumos do nosso time?

Vamos esperar a  convocação, o primeiro sinal de mudança. Ou de estagnação.

22 comentários

  1. Adoro você Alberto Helena Jr.
    Infelizmente colocar o Dunga ou qualquer outro técnico neste momento é chover no molhado.
    Um futebol onde privilegia um certo grupo de “carniceiros” que usurpam o talento alheio, estou falando destes empresários, que usam o talento e a “ingenuidade” das famílias destes jogadores (que não tiveram uma formação intelectual e até mesmo social digna) para favorecerem a si mesmos.
    Como permitir que pessoas como Wagner Ribeiro tornem-se “Semi Deuses” do Olimpo… Eduardo Uram, Jorge Machado e tantos outros que fazem grandes talentos como Oscar irem contra a própria instituição que os formou, em benefício próprio!
    Enquanto formos reféns destas pessoas, estaremos fadados ao fracasso!!!
    Nenhum clube enxerga a longo prazo… e não é manter treinador!!! E sim manter uma base de jogadores jovens e dar-lhes a oportunidade de perderem, chorarem e se frustrarem antes de vencerem!!! Qual foi o campeonato em que juntos jogaram: B. Uvini, Oscar, Casemiro, Wellington, Lucas Moura, W. José e Henrique???
    Campeões Sub 21 pela seleção em 2011, somente o Oscar foi avante na seleção!!!
    E clubes com grandes estruturas preferem trazer jogadores de times do interior ao invés de investir em times campeões de base!!!
    Tá difícil!!!

  2. Excessos (pecados) do Dunga:
    Organizar um grupo disciplinado, pois o mais importante é um produto e não o futebol em si.

    Buscar um time que não seja dependente de um jogador, que aproveita as oportunidades do futebol para promover suas marcas, em bonés, camisetas, óculos, brincos, peças intimas, ou qualquer lugar que possa render um money.

    Evitar a reprodução dos cabelinhos pintados em véspera de jogo, afinal de contas aquilo lá é uma “festa”.

    Ruim mesmo é o futebol da Alemanha, onde os principais jogadores buscam o resultado coletivo e não se exibem com marquinhas de CR7, R10, NJr, ou outras mais… Que VIVA os brinquinhos e cabelos “estilosos”…

  3. Vamos ser coerentes, o Dunga tem seus defeitos isto sabemos, mas para a classificação à Africa do Sul levou tudo com os pés melhor que Tele, Zagalo, Felipão,…etc..Não sofremos nadica naquela disputa. alem disso ganhou tudo para o Brasil :Copa America,Confederações, em fim foi melhor de todos com usa safra de jogadores meia boca, só porque perdeu para a Holanda , por fallha do zagueiro maluco e do goleiro que sai pegando borboletas à unha o cara foi crussificado e os 7X1 os 3 a 0…vamos cair na real o problema nosso é outro.

    1. O que mais tenho ouvido são asneiras em relação ao Dunga…Cobram tanto do novo técnico e não se cobram como profissionais de imprensa, existem tantos interesses alheios ao que é o Futebol que quando leio um tal texto poético fico sem saber qual o real interesse em expor comentários tão ridículos…Me lembro de uma reportagem onde apresentaram os jogadores alemães em um barco, e não vi ninguém lendo poesia, não que não deva, mas não era o caso, pois na ocasão estavam assimilando o que é ser um time coeso, onde cada um fazia sua função específica e isso vai muito de encontro ao que é necessário ser feito para montar uma equipe, mas se fosse o Dunga que tivesse feito iriam dizer que ele deveria ir para uma campina olhar os movimentos dos carneirinhos que pastam a grama verde expostos ao sol radiante e a brisa suave…Me ajuda aí Alberto Helena…

  4. Pior que perder de 7×1 e ficar em 4 lugar é perder de 2×1 nas oitavas, e Gilmar era reserva e guando jogava frangueiro, dois pernas dura como responsável pelo seleção da Nike/etc que bosta rumo copa 2022.???? RUSSIA ÇÇÇTTRERTYFCVHHBJMJNJBVGHHJn171.

  5. muito boa sua matéria sobre nossa seleção atual, creio que o Romário tem razão, em falar que tem que mudar tudo na CBF, estão acabando com o futebol Brasileiro, colocar um técnico de 2 ª divisão, para ser técnico da seleção foi o que deu, por favor acorda Brasil.

  6. Alberto Helena, entendo seu ponto de vista, mas sinceramente acho que Dunga é a melhor dentre as piores opções possíveis.

    Tite eles não iam escolher, pois é amigo do desafeto No. 1 de Del Nero e Marin: Andrés Sanchez. Tampouco Muricy, que é exigente. Abel Braga há tempos pulou fora e também não é “paneleiro”. Técnico estrangeiro nem pensar. Assim sendo, para que a mediocridade que são a CBF e os políticos brasileiros continue (lembre-se que Marin e Del Nero são políticos da pior espécie), resgatar Dunga foi mesmo o que havia de menos pior, pois ele (Dunga) fez um bom trabalho -em que pese ser adepto do futebol de volantes- e porque, assim, Marin e Del Nero ficarão como ‘bonzinhos’ e ‘justos’ quando as coisas começarem a dar certo.

    Para mim, Dunga é melhor opção do que Felipão, esse sim um tremendo mau caráter e arrogante, que arruinou o Palmeiras e a Seleção, e ainda teve a pachorra de dizer que a culpa pelas goleadas sofridas e o time ridiculo que montou era dos jogadores. Abs.

  7. Alberto Que pazer ler seus textos pena q o tema Dunga me tras a unica emocao enjoo, repugnancia alem de todas suas contribuicoes para ressucitar o verdadeiro estilo brasileiro que passa a anos luz de todos treineiros nacionais -chama-los de tecnicos seria fasidade ideologica- bata todo santo dia suas teclas INTERVENCAO NA CBF -na verdade eh uma cbd – mais vale ficar fora de uma Copa da fifa e recuperarmos nossa alma gigante de deuses da bola Alberto, o fut brasileiro precisa de vc nessa hora n tema mas cumpra sua derradeira missao, n estara sozinho muitos se juntarao , a

  8. Achei seus comentários absurdos e tendenciosos.
    Parece que está fazendo as vezes de jornalista de rede globo de televisão.
    Mas, fala para seus amigos da globo e do sportv que duvido que dessa vez ele vai enfrentar de frente vocês.
    Deveria enfrentar, mas não vai.
    abs

  9. eu fico assistindo futebol e fico observando que muitos jogadores sabem jogar tem talento mas sao meio burros meio nao burros. nao conseguem ver o jogo nao tem inteligencia dao passes onde sabe que o adverssario vai tomar e no fogo e nao corre para recuperar isso nao e falta de talento e burrice mesmo .
    os jornalistas ficam babando sobre futebol e nao da para saber o motivo que os jornais, tvs, radios web site pagam esses caras. sabem nada . o brasileiro nao precisa desta gente que baba asneira e ainda recebe salario. manda tudo embrora.

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