Tão importante quanto decidir corretamente os lances de ordem técnica e disciplinar, para que uma partida transcorra com normalidade, a forma como o árbitro cuida de outros aspectos paralelos é fundamental, pois muitos deles, apesar de aparentarem ser de pouca importância, são igualmente decisivos, e, assim, precisam ser bem controlados e resolvidos, sob pena de gerarem consequências graves para os jogos.
É por isso que algumas questões de ordem administrativa, que também são da alçada dos organizadores das competições, devem ser normatizadas, planejadas e executadas da melhor forma possível.
Após esta introdução, vale citar algumas das atividades que são de competência exclusiva dos árbitros e outras que competem tanto aos apitadores como, principalmente, aos organizadores das competições.

Situações de competência exclusiva dos árbitros:
Decisões técnicas
Decisões técnicas corretas, baseadas em uniformidade de critério de interpretação e durante toda a partida, é o meio mais eficaz para que tudo transcorra com normalidade. É bom ressalvar que uniformidade de critério de interpretação não se confunde com colocar no mesmo cesto todos os lances semelhantes, mas separá-los na medida em que se distingam, ainda que por detalhe: a forma da disputa; se o contato com o adversário foi antes ou depois de jogar a bola; a posição da mão/braço etc. etc.
Decisões disciplinares
Por igual, decisões disciplinares coerentes são muito importantes para o controle do jogo. Assim como as decisões técnicas, as disciplinares exigem que os detalhes das jogadas sejam considerados, tanto para tratá-las de modo igual, como para distingui-las e possibilitar decisões justas.
Autoridade do árbitro e atuação preventiva
O exercício da autoridade é, sem dúvida, de igual importância aos anteriores e, portanto, decisivo para que as partidas transcorram com normalidade, sobretudo com respeito entre os árbitros e jogadores e entre estes. Com efeito, mesmo quando algumas decisões técnicas e/ou disciplinares controvertidas gerem protestos, já que o futebol provoca reações emotivas, em especial em nosso continente, a autoridade da arbitragem precisa ser mantida, sob pena de prejuízo geral. É bom registrar que a autoridade a que nos referimos exige equilíbrio mental, serenidade de ações e, principalmente, respeito no relacionamento com os atletas, como dito. O árbitro nunca deve agir, seja com palavras ou ações, para elevar a temperatura de uma partida. Por igual, nunca deve consentir que os protagonistas do jogo o façam. A ação autoritária do árbitro gera tensão. O erro perdoado do jogador gera repetição.
Em harmonia com a forma acima, a atuação preventiva do árbitro, que julgamos ser a chave geral de uma boa arbitragem, decorre de sua sensibilidade para antever e, assim, evitar problemas, especialmente de ordem disciplinar.
A título de amostragem, vale indicar alguns desses pontos que, se mal observados, podem gerar dificuldade para a condução de uma partida: jogadores impedindo a cobrança rápida de faltas, quer segurando a bola ou jogando-a para o lado ou para cima, quer se aproximando ou se mantendo próximo do local da cobrança;
jogadores tentando evitar, o que é absurdo dos maiores, que o árbitro ouça o VAR durante as checagens ou se dirija para área de revisão; criando grupo e fazendo rodinhas em volta o árbitro; falando com o árbitro de forma agressiva e com dedo em riste etc. etc.
De outro lado, eis alguns dos pontos que são de competência dos árbitros e dos organizadores das competições
Áreas técnicas
A conduta dos integrantes das áreas técnicas, comumente inadequada, tem reflexo direto no comportamento dos jogadores em campo e tem acarretado consequências prejudiciais ao futebol.
Não é ocasional, senão rotineiro, os treinadores agirem de modo agressivo e, pela liderança que exercem perante o grupo, incendiarem os jogos e dificultam o trabalho dos árbitros.
Esta situação, apesar de dever ser controlada pelos árbitros no campo, concorrentemente exigem preventivas providências dos organizadores, sobretudo no campo educacional;
Áreas de aquecimento dos jogadores
A ausência de normas claras e definidoras das áreas técnicas, sobretudo de sua limitação geográfica, talvez agravada pela estrutura deficiente dos estádios, tem gerado dificuldade para as arbitragens, pois os locais de aquecimento, por serem muito próximos dos limites do campo de jogo, geram os mais diversos inconvenientes para os árbitros. Afora isto, o que é mais grave, ainda há as habituais invasões de campo, comuns nas comemorações de gols, além de não ser raro haver interferência nos jogos;

Gandulas
A conduta dos gandulas, que talvez seja um dos mais graves, antiéticos e negativos problemas de nosso futebol, precisa de medidas urgentes dos organizadores das competições, que podem até ser de transferência para si da responsabilidade de seleção, treinamento e remuneração desses profissionais.
Com efeito, não é possível, tolerável e sobretudo ético, que a reposição das bolas, com raras exceções, ocorra na razão direta do placar, conforme esteja a favor ou contra à equipe mandante, ora agilizando o jogo de modo anormal, ora o retardando e, até, dando sumiço nas bolas, o que é surreal. Esse desregramento se torna mais grave quando os treinadores interferem em tal atividade, com os olhos complacentes de todos.
Com esta indicação, por amostragem, de alguns dos problemas de nosso futebol, o que temos feito ao longo de anos, inclusive com sugestões escrita para aperfeiçoar os regulamentos das competições, desejamos concitar os atuais organizadores para adotarem providencias sérias e eficazes, que trarão ao esporte rei mais credibilidade e ética, nos livrando, por consequência, de tão graves inconvenientes.
Não foi por outra razão que nós, ao findar-se a denominada “Concentração na Granja Comary”, no final do campeonato de 2021, elaboramos, como Ouvidor de Arbitragem, um relatório para a presidência da CBF, interina à época, analisando as questões acima, além de muitos outros pontos, inclusive o perfil de nossos árbitros e as dificuldades técnicas porque passavam e oferecemos, como é dever de toda crítica responsável, as devidas sugestões para sanear as pendências, salientando que as soluções de muitos dos problemas de nosso futebol, que o tornam antiético e, às vezes, patético, só seriam alcançadas por meio de uma força tarefa envolvendo todos os agentes esportivos, inclusive e sobremodo, adotando medidas educativas, com a natural iniciativa e liderança da CBF e das federações estaduais, para as correspondentes competições.
Todavia, a atual administração da entidade não adotou qualquer das sugestões profiláticas oferecidas, em que pese haver mudado o comando da arbitragem e do Departamento de Competições, que são os órgãos diretamente ligados a tais problemas, como se tudo, doravante, passasse a ser feito de modo correto.
A divulgação para o público do relatório que elaboramos, a fim de submetê-lo à análise crítica dos desportistas, compete ao Sr. Presidente da CBF fazer.