Por falar em eugenia: como pensamos nossa corporeidade

O texto do professor Daniel Teixeira Maldonado, Um pouco de História: do currículo ginástico da Educação Física, traz à tona as tópicos que permearam as discussões ao longo de muitos anos no final do século passado. O corpo imaginado, pensado e almejado deveria estar condizente com as funções do “homem trabalhador”.

Nesse sentido, estimulo a memória dos adultos que viveram a Educação Física Escolar nos anos de 1950 a 1970, especialmente no seio das escolas públicas do Estado de São Paulo, quiçá no Brasil. Tínhamos a presença da Ginástica Sueca, exercícios de ordem unida, meninos separados das meninas, preocupação com a ginástica de demonstração, nenhuma apresentação ou discussão acerca da corporeidade individual e o respeito às diferenças.

Lembro-me, ainda com muita tristeza, dos finais de aulas, no Instituto de Educação Anhanguera (Lapa – São Paulo) em que os alunos que não houveram se apresentado de acordo com os padrões exigidos (correção e quantidade nos exercícios) eram submetidos ao “corredor polonês” imagem ilustrativa.

Para aqueles que não conheceram esta estratégia “educativa”, comum nas escolas, tentamos uma apresentação que exige um pouco de sua imaginação.

Final da aula, o professor convoca para estar à frente do grupo alguns dos alunos que, em sua ótica, não atenderam aos objetivos da aula (lembrando que se tratava da quantidade de exercícios que deveriam ser realizados por todos). Perfilava os demais alunos em duas fileiras, lado a lado no centro da quadra, solicitava que estes retirassem suas camisetas para, com estas bater nas pernas dos colegas “selecionados” para o “castigo educativo”. Os “a serem educados” deveriam passar pelo corredor, com a velocidade que conquistassem e serem alvo das agressões de seus colegas. Educação para machos. Educação para a punição dos menos hábeis ou “fracotes”. Lembro-me de algumas alcunhas que recebiam os alunos quando erravam movimentos ou eram lerdos. Os magrinhos eram chamados de “Jóquei de Pulga”, os mais gordinhos de “Jóquei de Elefante” e os menos coordenados de “Lesmas Lerdas”, ao que todos os demais riam em profusão. Mais um exemplo de estratégia educativa simbolicamente representada e reprodutora dos quartéis (origem da Educação Física).

Assim era o tratamento dado à corporeidade de meus colegas. Pasmem, tivemos isso nos primeiros semestres do curso de formação em Educação Física. Felizmente, ultrapassamos esta triste realidade. Ainda bem!!! Não acham?

Daniel Carreira Filho

5 comentários

  1. O que me deixa mais triste professor Daniel, não é que absurdos como esses que o senhor comentou tenham ocorrido, mas sim que pessoas atualmente ainda continuem com esse discurso eugenista e higienista em pleno século XXI, após ocorrerem tantas atrocidades com os seres humanos.
    Temos dados que o nosso atual prefeito tem uma política higienista com os mais pobres da cidade, tudo em nome de uma “cidade linda”, muitos professores de Educação Física continuam excluindo os menos habilidosos, tudo em nome das “competições escolares”, as grandes potências mundias fazem guerras patrocinadas, em nome da luta “contra o terror”, promovendo horrores com as crianças em várias partes do mundo (que são as mais fracas da história).
    Quando mudaremos a rota dessas políticas e viveremos realmente em paz, em um mundo menos desigual, valorizando as grandes belezas das diferenças humanas e com um pensamento mais coletivo e menos individual?

  2. Olá professor Daniel, realmente ultrapassamos esses atos, mas ainda é triste saber que mesmo nos tempos atuais, onde as diferenças são o que fazem cada pessoa ter sua especialidade, haver um tipo de exclusão quando algum aluno possui mais dificuldade em tal esporte ou atividade, haver “motivo” de piada. Isso nada mais é que regras que a sociedade impõe e que infelizmente algumas pessoas ainda acreditam que, de fato, são verdades. O ato do castigo educativo pode até ter sido um passado, mas que ainda continua de uma forma maquiada, por exemplo, em um colégio em que estudei, o time que não atingisse as pontuações e perdesse, eram obrigados a pagar “suicídio”, em que o grupo fazia exercícios corporais de alta potencia e todos deveriam fazer na mesma sincronia. Mesmo que não venha de um professor, ainda assim, muitos alunos são tratados de forma diferente.
    Bárbara – IFSPR

    1. Olá, Bárbara
      Há que se respeitar o outro. Não há mais espaço para estes equívocos, especialmente na escola. Que bom que você tem esta visão. Abraços.

  3. É triste saber que mesmo ultrapassando está triste realidade pessoas ainda possuem certa mentalidade atrasada de que estas seriam as formas certas de se ensinar educação física, e além disto mais triste ainda é de saber que em certas escolas ou faculdades este tipo de pré-conceito com pessoas com certa dificuldade em realizar exercícios ainda ocorra mesmo que seja de forma velada porém tenho plena convicção de que isto há de acabar um dia pois todos irão evoluir e ver que cada um tem a sua dificuldade e não é necessário julgar nem menosprezar o próximo e sim ajuda-lo.

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