O movimento é aprendizagem, para a vida

Em continuidade ao nosso texto da última semana, em que me referi à festa que assisti, observei uma criança tentando brincar no escorregador com seu vestido longo, o sapato com salto e as pressões do tecido sobre o corpo a impediam de brincar. Não lhe era possível subir as escadas sem pisar no vestido, enroscar o sapatinho nos orifícios do equipamento e a dificuldade em movimentar-se dentro do apertado vestido.

Em determinado momento, outro adulto, um homem, verifica a situação e informa; “não se preocupe ela está de maiô por baixo” como se fosse esta a limitação ao movimento da criança. Ou que as preocupações estivessem centradas na exposição de partes íntimas da criança. Na realidade é uma preocupação do adulto que molda sua atitude pelo comportamento esperado entre seus pares. Atitude, ainda, muito comum em nossa sociedade quando as atenções estão voltadas às meninas. Não está presente, muito menos percebido ou valorizado o aspecto da sexualidade pelas crianças em tenra idade. Presente está, isto sim, nas mentes dos adultos sem conhecimento sobre a vida das crianças.

Quando encaminham crianças para uma festa infantil, em que outras pequeninas estejam ávidas pelo encontro para inúmeras brincadeiras, as vestem como adultos em miniatura, cerceando sua liberdade de movimento, de aprendizagem e de alegrias. Exigências sociais que, de fato, impedem o desenvolvimento das alegrias e crescimento promovidos pelo livre movimentar-se.

A liberdade de movimentar-se, brincar, jogar-se no solo, rolar é que favorece o pleno desenvolvimento das crianças, não as expectativas dos familiares, em especial os pais, que vestem suas crianças para a exposição social totalmente distante dos desejos infantis.

Vivi, no exercício profissional inicial, a atuação docente em pré-escolas, durante 10 anos o meu aluno mais velho tinha 6 anos. Em uma das instituições em que atuava havia a possibilidade da piscina. Então, vamos para o meio líquido com todas as crianças. Quando as esperávamos, observei três delas vindo muito lentamente em minha direção. Fui saber o motivo e disseram, nossas mães esqueceram de colocar nossas roupas para a piscina. Imediatamente perguntei, “estão de cueca e calcinha por baixo do calção de ginástica? ” De imediato, sim, estamos. Orientei no sentido de guardarem seus calções em suas malinhas, irem para a piscina de cueca e calcinha. A alegria foi imediata. Participaram da aula como todas as demais. Como a aula era após o intervalo, orientei que, ao saírem, colocassem o calção e guardassem a roupa molhada na lancheira.

A seguir, a coordenadora pedagógica nos chama para me advertir sobre minha “atitude de atendado ao pudor ao expor as partes íntimas das meninas aos meninos, incluindo os peitos das menininhas de 4 anos de idade”. A completou, “o senhor não satisfeito com suas aulas em que todas ficavam sem as camisetas (calor intenso) fez aprimorar seu atentado”. Ao final do semestre letivo pedi minha demissão da escola.

A mente dos adultos despreparados é que prejudicam o desenvolvimento saudável das crianças. Há mais exemplos deste despreparo e incoerência.

Daniel Carreira Filho

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